segunda-feira, 29 de setembro de 2008

A LOBA

Sou a loba que ouviste ao luar / Descendo a clareira mansamente / Uivando triste perdidamente / A ganir e a soluçar / Da montanha desce e traz a luz da lua / A marcar-lhe o tempo no seu ventre cheio / No olhar o uivo faíscando a noite nua / Já o homem deita ao cavalo o arreio / Dentro de portas guarda-se em segredo / Quem é ela e do misterio faz-se medo / Como brisa dessa trágica herança / Também já eu soube guardar / Um dia uma noite toda a minha vida / Pequena memória da minha infância / Os seus passos marcados sobre a neve fria / Ficar guardando a noite gelada vencida / Atrás da mortiça janela / Bailado de luz velada e sombria / Ouvindo o choro dela parece uma criança / Ouvindo o grito maior ao sentir-se encurralada / E os homens fazendo a espera / Com archotes iluminando a escuridão enluarada / No ventre pulsando a vida que há-de nascer na Primavera / Na minha alma lua medo noite e um dia / Sou a loba que desce ao vale / Pelo caminho da clareira enevoada / Com fome de palavras e a barriga vazia / Procurando sustento espalhando o mal / Sou a loba do tempo incauto dos sonhos e da fantasia / Arrastando as minhas mágoas sobre o gelo do chão / O alento que faz dela tão desgraçada / Temente feroz animal / Uivando na solidão / A loba que desce ao curral / Por estar esfomeada / De palavras / E de pão /

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