sábado, 29 de outubro de 2011

TEMPO DE UM HOMEM SÓ

Tentaste parar o tempo
Para eu não partir
E não foi o tempo
Capaz de impedir
A minha partida
Dolente despedida
Pude atrair

O relógio mutilado
Quebrado na vida
Sem o consentir
Jaz parado
No sentir

E tu conformado
Sentado no chão
Olhar estagnado
Dorida sensação

Não consegues pedir
Que o tempo pare as horas
E todas as demoras
Desse combalir
Todas as dores
As ingratidões
Os doidos amores
As compaixões
O ir e o vir
Querer fugir
Contratempo
O desalento
A saudade

Ficou entre os ponteiros
Do relógio parado
E tu inconformado
Ganhas liberdade
Libertas ansiedade
Dando asas ao fulgir
Aprisionas o tempo
Do instante do sentir

Paras pensamento
Rosto fechado sem sorrir
Escondes sentimento
Algemas ponteiros
Das horas quietas
Minutos certeiros
Vontades secretas
Sentado no chão
Esperas descalço
Que venha a solidão
No teu encalço

Vidros quebrados
do relógio com pó
momentos marcados
tempo de um homem só...
musa

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

DANÇA DA SOLIDÃO homenagem a Clarice Lispector


DANÇA DA SOLIDÃO


Estou cansada de viver
Estou com vontade de partir
Chego aqui sem saber
O quanto do tanto deste sentir
Toda esta desilusão
Por dentro a estremecer
Correr de tanta emoção
Entre viver e morrer
Amar ou odiar
Saberei e nada faço para mudar
Este cansaço de viver leve manso
De toda a minha vida em remanso
Que tanto me atormenta
De tudo o que não consegui alcançar
De todo este medo que me enfrenta
Entre o sentir e o imaginar
Quero tanto partir
Quero tanto viver
E no contrabalanço de não me decidir
Danço a dança do sentir
Num terreiro imaginado
Docemente pisado
Corpo e alma desapegados
Rodopiam imaginação
Dançam até ficarem cansados
A dança da solidão
musa

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

HÚMIDO SENTIR


Se o mar não parar de chover 
humedecidos sentidos 
a alma vai transbordar de tanto sentir...
É tanta a chuva que a poesia molhada 
cheira às palavras 
humedecidas de sentir...


Mulher sentada entre luas

reza a prece dos sentidos
espera o desfilar de faluas
que tragam sonhos perdidos
arcas cheias de húmido sentir
sombras tombadas pelas ruas
no chão do chegar e do partir
escuridão que abraça os vencidos
da terra à lua no limbo dos excluídos
entranhada fria claridade parida cinzenta
verte-se vazia a alma perde-se choro
doce chuva que por dentro enfrenta
este sentir onde me demoro
e de chuva sinto as palavras
gotas húmidas de mágoas
trazidas do mar revolto
como este sentir solto
que de dentro clama
e por mim chama
Oh! poesia vil
o dia anil
é noite
...
musa

DIÁLOGO de um sonhador NOITE & DIA (musa)… à beira-mar

Dos meus sentidos intactos abrem-se fissuras tácteis na palma da alma
partilho completamente o teu gosto, mas com uma boa companhia, com uma cumplicidade mutua e sem ninguém por perto para quebrar o momento
instantes que podem ser imaginados mesmo com este dia cinzento e molhado... por isso o sol dentro de ti quando esta a chover
imaginação.... essa pode levar-nos onde mais queremos, uso-a como arma secreta em alguns momentos, mas neste momento queria mesmo era sentir a areia debaixo dos pés
nada que não se possa sentir... secretamente escapulindo-se para esse areal imaginado
por mim era já, largava tudo e partia, não olhava para o ontem, e nem perdia mais tempo
o tempo não existe na imaginação
pode existir, no âmbito de o podermos parar ou esticar, prolongar certos momentos
perdidos no tempo
dois pensadores sempre são melhores que um só
existencial sentir num imaginário de solidões
com pensamentos secretos e quentes, húmidos como o tempo
pálidos e excitantes
ofegantes com respiração ritmada
gestos e carícias de enlouquecer
peles meladas de roupas coladas, com cheiro de terra
corpos extenuados no sentir
lábios murmurantes de sussurros com asas
dança de mãos num bailado de olhares
indiferentes com o redor
com o jogo das incertezas
mimos dedicados
e muitas outras proezas
como dois escorpiões tentando ferroar-se mutuamente
diante de um julgado de mar bravio barulhento e chuva intensa
a areia sulcada de grossas gotas e marcas de pés nus
a roupa sai do corpo por gestos manipulados
os corpos fundem num só
resvalam como duas enguias
sem atrito sem pudor
mordidelas suaves no corpo
textura sentida nas palmas das mãos
sopros de brisa marítima modelam arrepios na pele
formas que se elevam entesam
olhos que fumegam em delírio
bocas que sorvem beijos de chuva
mãos que se digladiam em martírio
momentos pelos quais não se quer parar
aceleração e abrandamento constante
a forja recebe o metal derretido
os uivos de dois lobos ecoam no horizonte
as garras de duas águias rasgam a pele
as vagas revoltadas fazem ninho  em espuma branca
o mar parece vazio diante de tão intenso sentido
cheio de desejo cavando na pele fome de beijos
a praia é uma terna e doce manta
adoras a imaginação… iol
és uma poetisa com estilo
vives o momento e sentes a emoção
mas eu deixo-me levar, envolvo-me e sinto-me febril, ardente e emocionalmente envolvido
fico com vontade e desejo de um toque, de uma carícia de um beijo…
sonhador Noite & Dia musa

terça-feira, 25 de outubro de 2011

SÓ UMA VIDA


Desejei ter uma vida
Só minha
Sem partilhas
Nem sentidos
Rainha
Duma vida solitária
De mistérios
E de segredos
Proibidos
Imaginária
De medos
De ousadias
De fantasias
De enredos
De enlevos
Prisioneira de alegrias
Moradora de sonhos
Fazedora de poesias
À rédea de demónios
Lutadora de vaidades
Por caminhos de solidão
Cativeiro de liberdades
Em passos de sedução
E essa vida desejada
Afinal não era
O que eu queria
Entre o tudo e o nada
Mais valia
Somente ser
Poesia
musa

MAR ACINZENTADO

Tropelias do tempo
Dia de intenso chover
Ah… esse mar cinzento
Que do cais fico a ver
De farta crina branca
Amaciando pensamento
E minha alma espanta
Fino pano de mantel
Ondulando ao vento
De relevo delicado
Bravio mar encanto
Vagas rasgadas a cinzel
Riscos laivos de pranto
Brancas como papel
Mar acinzentado
Que se perde em tropelia
E na pele deixa molhado
E nos meus olhos levanta vagas
E no pensar faz-se poesia
Luzidio gume de adagas
As gotas grossas da chuva
Em brisa de maresia
De cor cinzenta turva
Sentimento delicado
Mar imenso alterado
Pensamento guardado
Cor cinzenta do dia
musa

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

ZÉFIRO

Zéfiro deus do vento oeste
das brisas suaves
do ar gélido e agreste
dos voos das aves
rasgando céus
imponentemente
fazendo esvoaçar véus
suavemente
Deus violento
indomável
arrasador de plantações
de força sedento
intocável
vento  das monções
intratável
provocador de naufrágios
ferido de paixão
inspirador de adágios
a Flora entregou seu coração
tornando-se doce e moderado
e a rainhas das flores
conquistando o seu amado
soprou ao vento seus amores
num céu azul apaixonado
...
musa

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

CRÓNICA DE UMA RUA DE PARIS


CRÓNICA DE UMA RUA DE PARIS
18 RUE TITON
Estranho sentimento aflora a boca da alma com fome do passado. Tinha 21 anos e era uma menina cheia de sonhos e agora passados 25 anos, lembro a rua de Paris , 18 rue de Titon, onde aportaram todos esses sonhos levados em regaço de menina do campo para a metrópole mais agitada da Europa nos anos 80.
No 11º bairro de Paris entre Nation e a Bastille, muito perto do Faubourg Saint-Antoine que hoje é a fronteira entre o distrito 11 e 12 de Paris é uma das mais antigas zonas da capital francesa, que leva o seu nome da antiga abadia de Saint-Antoine, demolida no final do século XVIII.
Quantas vezes, entrei na igreja de Santo António, abraçada de habitações, quase despercebida na rua, com seu torreão do lado direito, em busca de refúgio e protecção pelo sentimento de solidão e abandono, perdida na grande cidade, tão diferente da aldeia que tinha deixado lá atrás dos montes, onde as camas são perfumadas de urze e rosmaninho, os rios refrescam do estio infernal e as lareiras aquecem almas com frio de tolher os ossos.
E ainda não havia tempo de escrever palavras, com sentido de sentir. As palavras eram escritas como forma de exorcizar medos e aguentar forças para vencer barreiras e aceitar diferenças, ordeiras de sentimentos pouco entendidos, feitas de injustiças e devaneios, caminhavam pelo corpo adentro como raízes das sombras em busca de chão firme na alma tintada de lamas a coberto de vontades feitas de ilusões.
No colo de Santo António, sentia a firmeza do ser guardião de lembranças, pregadora de palavras não aos peixes mas aos sentidos, transtornada pelo destino cativeiro intemporal de recordações, armazenava com o olhar tantos pensamentos em forma de preces, desfiados em poético sentir, no enlace de dias rudes e intensos, profundamente marcantes e perturbadores, lapsos de memórias contidas de espanto, tais eram as diferenças com a realidade de onde vinha, e era só uma menina.
Crescia perto do santo de quem tomei o nome, longe de imaginar que um dia assim seria conhecida, de forma a agradecer protecção e força ao longo de todos estes anos de vida em conhecimento, com uma espiritualidade que muitas vezes é incompreensível aos homens, caminheira e peregrina de aventuras em forma de palavras.
anabarbarasantoantonio

terça-feira, 11 de outubro de 2011

SONHO AFOGADO


E vem o sonho mar cheio
E faz da alma oceano
E vem o pensamento
Doce intuir enleio
Intenso tamanho
Sentimento

Grita barulhento
Agita-se de vagas alteradas
Mar encrespado cinzento
Ondas atrás de ondas agitadas
Inundam de azul olhar
Que esta madrugada fui ver
Sobre o areal ainda molhado
Senti debaixo dos pés o prazer
De todo esse mar frio e salgado
Fazendo-me sentir e ser
Aos meus pés descalços
Areia do areal inundado
Perdidos olhares percalços
De um só pensar
Vaga de mar
Sonho afogado
musa

SOCALCOS DO DOURO


Ser em cada folha
Sorte de sentidos
Como quem olha
Desconfiada
Sonhos bebidos
Doces adivinhas
Alma decantada
Cachos amadurecidos
As cores afogueadas
Ocres de sentidos
Nas folhas das vinhas
Canteiros do Douro
Uvas adocicadas
Da cor do ouro
Cachos despidos
Bagos maduros
Socalcos perdidos
Trabalhos duros
Desse vindimar
Floresta folheada
De páginas rasgadas
A vinha vindimada
Em cestos guardadas
Num nostálgico olhar
Despida nudez
As uvas colhidas
Um parto talvez
Canto vindimar
As folhas caídas
Doce soluçar
Em socalcos ternura
Ébria loucura
Do Douro poesia
Tertúlia dos céus
Néctar do deus
Baco o poeta
Que o poema desperta
Em vinho fantasia
musa

POEMA DEPOIS DE TE CONHECER


Anima por mim repartida
Todas as palavras que trouxeram de ti
Poema depois de te conhecer
Uma alma em mim sentida
O que por ti eu senti
De estranho prazer
Em ti consentida
Anima ser

Poema ao porto dos sentidos
Amarras de palavras laços
Sentimentos repartidos
Em beijos e abraços
Entre nós tidos
Nos espaços
Por preencher

O que fica depois de te conhecer
Feito o poema em transgressão
Seja por aventura ou por prazer
No tanto dessa mágica loucura
Feita de vontade e de paixão
Nos fios doces da enlaçadura
Que por palavras de sedução
Espalho de carinho e de ternura
Palavras de boa disposição
musa

CEGUEIRA


Cega dei a mão
Colhi pensamentos
Cegando sentidos
Mondando sentimentos
Da razão ao coração
Cegos perdidos
Doidos aturdidos
Desilusão
Tristura
Loucura
Porquê
Cego é aquele que não vê
Ser nó da urdidura
Cego é aquele que sente
Aquele que mente
Triste tortura
Cegueira demente
Mundo sem cor
Vazio de amor
Negrura
musa

MÃO ESTENDIDA


Tomba ao teu lado
Mão estendida
Por uma vez
Alcança a mão
O punho fechado
Na palma medida
O gesto talvez
O coração

Dou-te a minha mão
Cinco dedos em garra
Por consideração
No teu sentido guarda
O meu sim e o meu não
Que só tu podes escolher
Entender a razão
Que possas compreender
A voz do coração
E poder ser
Ilusão
Os cinco sentidos despertos
Como cinco dedos da mão
Cinco sentimentos secretos
Entre o insano e a razão

Amor amar sem fronteiras
O ódio odiar por maldade
Alegria feita de tantas maneiras
Em tristeza quase uma vaidade

Que a mão te possa estender
E tomes dela o que precisares
Que nos cinco dedos possas ver
O que fazeres sem te enganares

Cuida essa mão com jeito
Sem abusares da sorte
Nem invocares a morte
Nem com rancor no peito
Dádiva de tudo o que é certo
Na dúvida do que é incerto
Nessa mão estendida
Aberta a palma da mão
Ofereço-te a vida
Dou-te o meu coração
musa