sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

NÃO DEIXAREI A TRISTEZA

NÃO DEIXAREI A TRISTEZA

Bairros ausentes de janelas fechadas
Lavradio de silêncio em memórias guardadas
Quem sabe testamentos por cumprir
No papel rasgado o desassossego desolador
E no esquecimento do pó humedecido
Um olhar da janela entristecido
A sombra luz a refulgir
Em laivos fugidios de amor
Uma telha desviada 
Uma brecha mutilada 
Um vidro partido
A brisa bruma névoa a fluir
E o lugar da porta ausente
Todos os sonhos evadidos
Nada por possuir
A cama ainda quente
As lágrimas a escorrer
E a única certeza
Não deixarei a tristeza
No vão da vida morrer
Por entre os versos perdidos
Um odor de grito profundo
As tábuas do chão dos sentidos
E dos verbos tanto que fica por escrever
No fundo da alma bem fundo
Resquícios do encerado em vincos mágoa 
Farpas nos dedos feridos
Preces murmúrios gemidos
Olhos vazios ombros descaidos
O maior peso do mundo
A palavra
   
musa

terça-feira, 16 de janeiro de 2018

MENINA

MENINA
para a tua primeira netinha

Uma flor oriunda
Luz da madrugada
Envolve profunda
A terra sagrada
Teu sangue erguido
Ao altar em esplendor
O doce sentido
Pétala caída
Doce fervor
Pedaço de vida
O sonho prometido
A lua oferecida
O grito derradeiro
O maior o primeiro
Desejo desmedido
Alegria frágil dor
Sensível harmonia
Dádiva do universo
Ternura melancolia
Graça sem preço
Serenidade
Doçura de poesia
O mais lindo verso
De um poema de amor
Menina sinfonia
Meiga intimidade 
Afago sedutor
Felicidade 

musa

PROTECÇÃO AO PARTO

PROTECÇÃO AO PARTO
em memória da bisavó parteira
Maria da Encarnação

Ainda hoje te invoco
In loco
Ainda acendo a vela
A iluminar
Memória extenuante
Saudade distante
Luminosidade do olhar
Os teus olhos de um azul aguado
Aberta a janela
Para o tempo
No passado
As pernas escancaradas
As mãos ferradas
No gradeamento
Do infinito leito
E a bater no peito
Morno húmido leitoso
Um grito poroso
Quase lamento
A deixar transparecer
Da tesoura o corte
O fio de coser
O sentimento
E o medo da morte
E o lívido aço
E no rosto o cansaço
E a avó aliviada
E o parto no regaço
A sina a sorte
Assim ditada
Terna protecção
O doce abraço
Mansa a vida
Prece oração
Sentida
...
musa

domingo, 14 de janeiro de 2018

CALIGRAFIA DO CREDO

Ao meu misterioso poeta ...

CALIGRAFIA DO CREDO

Acreditas nos lagos azuis
Cheios de mistérios por decifrar
O mapa da alma no olhar
A sensível estrada por onde caminhas
E nessa caminhada adivinhas
As asas com que de palavras sonhamos voar

"Só estou de passagem
De mãos vazias
Sem bagagem ou mala
Lonjuras sombrias
Ou safra onde esquecer
No suor a imagem
O grito que cala
O doido sofrer
O desamor
Ou desafio
Deságio
O frio 
A dor
A sensibilidade
O presságio
A intimidade
A alegria ou o terror
Com que ficamos para a eternidade
J."

Tropeço nos rumos
Trilhos da imaginação
Na desorientada saudade
Na ilusão à deriva
Na solidão esquecida
Melancólica sedução
Caligrafia do credo
Nos versos e na verdade
Onde tarde ou cedo
Rasga dilacerante
No mais profundo consentir
Creio na poesia escrita pulsante
A correr viva o poema
Contundente a ferir
Asa serena
Distante
Sentir
...
musa

quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

MADRUGADA

MADRUGADA

Acordo às seis da manhã
Acendo a madrugada
No escuro da alma
Às seis a vã
Claridade
Tropeça no sombrio
Silêncio que acalma
O mar como um rio
De sombra intimidade
E o sussurrar da estrela alva
Vai tingindo a manhã de luz
E cedo a escuridão manchada
Do despertar da alvorada
A vigília conduz
Doce erguer
Da matinal vida
A eterna toada
Do curto viver
A espiral missiva
Que a morte tardia
A cada dia
Agradecer
...
musa

VIAGEM DE SILÊNCIO

VIAGEM DE SILÊNCIO

Atravesso florestas de luz e silêncio
Ruídos de folhas a balançar
Asas de pássaros assustados
Rios rebeldes agitados
Sereno trepidar
Guia a luminosa viagem
E ao atravessar a paisagem
Dos caminhos à clareira
No silenciado olhar
Parece bramir a imagem
Da folha a cair
No regato húmido e ruidoso
O morno sol como uma lareira
Espelha o fogo dançante
Do silente sentir
Áspero rugoso
O frio enrijece a madeira
Parece ferir
A luz soluçante
O riacho que chora
A treva delirante
Onde o grito se demora
Quase que gemidos
Rasgam deslumbrados sentidos
Secretos lugares por descobrir
E mais adiante
Recantos perdidos
Sente-se a alma
Em íntimo divagar
Por templos esquecidos
Luminoso existir
Parece persistir
Onde repousar
Sonhos vivos
E ficar
...
musa


https://youtu.be/ou4Bw5QUaH4 

INVERNIA

INVERNIA

A fúria das palavras
Sacode a ventania dos sentidos
E a tarde de silêncios divididos
Entre sonhos cinzentos e enfurecidos
Deixa a metade por entardecer
Nos verbos intransitivos
Por aprender

Na temível tempestade
O gelo a derreter
A húmida opacidade
Das palavras por sentir
Uma a uma ou outra fugidia
Parece repetir
A cada dia

Hora a hora o grito temporal
A tarde dourada que esfria
Lateja em raiva emocional
Uma réstia ainda melancolia
No verso lágrima por dizer
De vivo rumor visceral
Parece escorrer
Sentimento

Brado ou ladainha ou amargurada canção
O murmúrio das palavras em invernia
Dias negros de loucura e solidão
Prece ou cântico vento
Em uivo amargura de agonia
Dócil descontentamento
Tristes dias de escuridão
Silente súplica inocente
Pranto euforia
A vida da gente
Dor ingratidão
Em testamento
Choro lamento
Desolação
...
musa

NEVÃO NA SERRA

NEVÃO NA SERRA

Fardo leve sobre os pinheiros
De uma alvura gélida a entranhar-se
Nudez profunda a emaranhar-se
Nos ramos esguios inteiros

Frondosos de uma robustez
Mais dorida do que dor em pontadas
Ou uma agonia morna talvez
Leves caricias gentis e demoradas

E a brisa sacudindo teias e pó das telhas sombrias
O casebre abandonado ao manto branco da serra
Parece sussurrar doces e ternas melodias

Numa vénia ou abraço beija-o de neve e de ternura
Inventa-lhe o maior amor e humildade sobre a terra
Um casal de velhinhos vivendo a solidão da loucura
...
musa

sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

ODORES INFINITOS

ODORES INFINITOS

Sobre as pedras de algodão porosas
Que lágrimas arrastam do olhar
Como se a alma pudesse perfumar
O chão a pele e as mãos com água de rosas

A envolvência de silêncio micelar
Perfumes antigos de uma arte perdida
E das mãos rústicas e bondosas
A química e o silêncio da vida
Fossem selagem do sentir
Cardos palavras sequiosas
Numa aridez enternecida
A fazer existir
O tempo

A mágica fórmula de odores infinitos
Como um sopro de vento
A talhar a pedra de poesia
Em mansos gritos
De sentimento
E melancolia

Na serena magia de um abraço
De mulheres no gesto e no conforto
No momento e no cansaço
Das pedras da calçada
Da rua e da estrada
Do cais e do porto
A dizer-te adeus
Entre lábios o estremecer
A olhar dos céus
Tão cansada
De viver
...
musa

quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

PRECISO DO TEU ABRAÇO

PRECISO DO TEU ABRAÇO

Preciso do teu abraço
Da força que tem o teu silêncio
Para embalar o meu cansaço
E o rio das lágrimas que corre por dentro
E o sossego do teu peito a estremecer
E todos os medos nos teus lábios sentidos
Preciso dos teus braços abertos e estendidos
Como se nesse leito eu pudesse adormecer
E nos teus lábios os beijos bebidos
Fossem gotas de vida nos meus olhos a morrer
Todas as mágoas como seixos lavados
Preciso do teu corpo só mais um instante
De todas as tuas palavras e os teus olhos aguados
Um segundo minuto momento hora
Ir um pouco mais adiante
Para sossegar esta demora
Este sentir tão perto e distante
...
musa

segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

ALICE

Obrigada ❤

ALICE

Veio a noite sobre as colinas
Cobriu de negro todas as papoilas despidas
Semeou de lágrimas um silêncio triste
E o vento de punho em riste
Abriu de mansinho novas feridas
No obscuro olhar as meninas
Saudosas e sentidas
Desabrochando as flores que repartiste
Floriram de luz com a tua partida
Iluminaram versos na escuridão
E o poema de despedida
Um jardim de afectos pela tua mão
Uma flor de vida
Meiguice do teu coração
...
musa