quarta-feira, 23 de maio de 2012

SENTIR ILUSTRADO

Tenho por dentro memórias
Forradas com papel encerado
Tal como nas muitas divisórias
Da casa que aluguei dentro de mim
Toda forrada de um sentir ilustrado

Sei que ainda sabes o colorido
Da forma que sentes o sentido
Cada caricia na textura
Trabalhada com ternura
O cheiro novo do papel
O odor da cola e do verniz
Como se vestisses uma alma pele
E com isso já te sentisses feliz
Esquecendo as esquinas esbotenadas
Da velha cómoda de madeira
Com fissuras esbranquiçadas
Mas tão elegante à sua maneira
Nas gavetas arrumadas
Que deixava entreabertas
Mostrando esse ilustrado sentir
As minhas memórias secretas
Assim escancaradas
Como se as estivesse a parir
E tão vaidosa que me sentia
Orgulhosa e habilidosa
Dava comigo a rir
Frente ao gavetão vazio
Acariciando o papel frio
Com os meus enredos
Na cómoda fantasia

Não sei se algum dia te falarei dos meus medos
Do que guardo em cada papel mudado
Dos meus sonhos e dos meus segredos
Que estão lá… no fundo desse gavetão fechado
musa

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