CRÓNICA DE
UMA RUA DE PARIS
18 RUE TITON
Estranho sentimento
aflora a boca da alma com fome do passado. Tinha 21 anos e era uma menina cheia
de sonhos e agora passados 25 anos, lembro a rua de Paris , 18 rue de Titon, onde
aportaram todos esses sonhos levados em regaço de menina do campo para a metrópole
mais agitada da Europa nos anos 80.
No 11º bairro
de Paris entre Nation e a Bastille, muito perto do Faubourg Saint-Antoine que
hoje é a fronteira entre o distrito 11 e 12 de Paris é uma das mais antigas
zonas da capital francesa, que leva o seu nome da antiga abadia de
Saint-Antoine, demolida no final do século XVIII.
Quantas vezes,
entrei na igreja de Santo António, abraçada de habitações, quase despercebida
na rua, com seu torreão do lado direito, em busca de refúgio e protecção pelo
sentimento de solidão e abandono, perdida na grande cidade, tão diferente da
aldeia que tinha deixado lá atrás dos montes, onde as camas são perfumadas de
urze e rosmaninho, os rios refrescam do estio infernal e as lareiras aquecem
almas com frio de tolher os ossos.
E ainda não
havia tempo de escrever palavras, com sentido de sentir. As palavras eram
escritas como forma de exorcizar medos e aguentar forças para vencer barreiras
e aceitar diferenças, ordeiras de sentimentos pouco entendidos, feitas de
injustiças e devaneios, caminhavam pelo corpo adentro como raízes das sombras
em busca de chão firme na alma tintada de lamas a coberto de vontades feitas de
ilusões.
No colo de
Santo António, sentia a firmeza do ser guardião de lembranças, pregadora de
palavras não aos peixes mas aos sentidos, transtornada pelo destino cativeiro
intemporal de recordações, armazenava com o olhar tantos pensamentos em forma
de preces, desfiados em poético sentir, no enlace de dias rudes e intensos,
profundamente marcantes e perturbadores, lapsos de memórias contidas de
espanto, tais eram as diferenças com a realidade de onde vinha, e era só uma
menina.
Crescia perto
do santo de quem tomei o nome, longe de imaginar que um dia assim seria
conhecida, de forma a agradecer protecção e força ao longo de todos estes anos
de vida em conhecimento, com uma espiritualidade que muitas vezes é incompreensível
aos homens, caminheira e peregrina de aventuras em forma de palavras.
anabarbarasantoantonio
2 comentários:
Parabéns pela sua escrita, que, posso dizer-lhe, me conquistou completamente.
Obrigada Maria da Fonte e Parabéns pela distinção merecedora <3 do teu sentir <3
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