domingo, 17 de julho de 2011

À CASA MINHA (a David Mourão Ferreira)



À CASA MINHA (poema a David Mourão Ferreira)
“CASA
Tentei fugir da mancha mais escura
que existe no teu corpo, e desisti.
Era pior que a morte o que antevi:
era a dor de ficar sem sepultura.

Bebi entre os teus flancos a loucura
de não poder viver longe de ti:
és a sombra da casa onde nasci,
és a noite que à noite me procura.

Só por dentro de ti há corredores
e em quartos interiores o cheiro a fruta
que veste de frescura a escuridão. . .

Só por dentro de ti rebentam flores.
Só por dentro de ti a noite escuta
o que sem voz me sai do coração.”
David Mourão Ferreira
Infinito Pessoal
(1959-1962)
Obra Poética
1948-1988
4.º Edição
Editorial Presença

À CASA MINHA
Homem que à casa minha
Meu corpo acedes
Escuridão que caminha
E sobes pela voz
Escadas do sentir
Onde me amas a sós
E aos meus olhos concedes
Janelas por abrir
Para entrar tua claridade
Onde luz é treva do meu ser
Paredes de luminosidade
Desejos íntimos de se ter
Corpo que te recebe
Sentir que te concebe
Abrigar por querer
Meu corpo dado prazer
Morada em mim
Casa da loucura
Erotismo sem fim
Corredores de procura
Pelo cio salas de vício
Esvoaçam cortinas de frescura
Recantos de meigo tesão
Divisões de sacrifício
Poro a poro o teu chão
A esse gozo propício
Onde te abrigas sem tempo
Cheiros que te são intimidade
Do coração já lamento
Da alma telhado felicidade
Poema que imaginado antevi
Tua sepultura sentimento
Do teu ser à terra eu senti
Dar-lhe voz pensamento
Neste verso por ti
musa

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