À CASA MINHA (poema a
David Mourão Ferreira)
“CASA
Tentei fugir da mancha mais escura
que existe no teu corpo, e desisti.
Era pior que a morte o que antevi:
era a dor de ficar sem sepultura.
Bebi entre os teus flancos a loucura
de não poder viver longe de ti:
és a sombra da casa onde nasci,
és a noite que à noite me procura.
Só por dentro de ti há corredores
e em quartos interiores o cheiro a fruta
que veste de frescura a escuridão. . .
Só por dentro de ti rebentam flores.
Só por dentro de ti a noite escuta
o que sem voz me sai do coração.”
David Mourão Ferreira
Infinito Pessoal
(1959-1962)
Obra Poética
1948-1988
4.º Edição
Editorial Presença
À CASA MINHA
Homem que à casa
minha
Meu corpo acedes
Escuridão que caminha
E sobes pela voz
Escadas do sentir
Onde me amas a sós
E aos meus olhos
concedes
Janelas por abrir
Para entrar tua
claridade
Onde luz é treva do
meu ser
Paredes de
luminosidade
Desejos íntimos de se
ter
Corpo que te recebe
Sentir que te concebe
Abrigar por querer
Meu corpo dado prazer
Morada em mim
Casa da loucura
Erotismo sem fim
Corredores de procura
Pelo cio salas de vício
Esvoaçam cortinas de
frescura
Recantos de meigo tesão
Divisões de sacrifício
Poro a poro o teu
chão
A esse gozo propício
Onde te abrigas sem
tempo
Cheiros que te são
intimidade
Do coração já lamento
Da alma telhado
felicidade
Poema que imaginado
antevi
Tua sepultura
sentimento
Do teu ser à terra eu
senti
Dar-lhe voz
pensamento
Neste verso por ti
…
musa
Sem comentários:
Enviar um comentário