quarta-feira, 16 de março de 2016

ELOGIO À LOUCURA (em memória de Maria Zamora)

ELOGIO À LOUCURA (em memória de Maria Zamora)

Sentei-me na escada comprida
Diante do cadáver de todas as mulheres
Que um homem matou
Tirou lhes a vida

Segredando lhes ao ouvido
... "Se ainda me quiseres..."

E apertar o garrote de seda crua
Ainda lhes sussurrou
... "Como és bela nua..."

E a vida passa diante do olhar
Desce degrau a degrau
Vai para a rua
Dançar

Na TV falam de um homem mau

Dizem que cometeu um acto de loucura

Falam dele todas as televisões
Comentam a barbárie e a tortura
Escada abaixo rolam todas as ilusões
Tropeça a serenidade
No patamar dos sentidos
Elogia se a fatalidade
Os olhares ofendidos
Calam a frialdade
Do meigo terror

Talvez um dia eu desça as escadas a correr
Para abrir a porta a todas essas mulheres com olhos de dor
Que no poema eu vi morrer
Em poesia elogiada falso amor
Um travo de boca
A palavra louca
Apunhalada
...

musa

“olhem bem: este é o olhar da Maria Zamora. 1 ano depois o MP nada diz à família.
Maria, prometo-te que vou saber do processo contra a besta que te andou a fazer mal, ele será responsabilizado. não serás esquecida. para que nunca mais nenhuma mulher sofra o que tu sofreste. prometo que vou continuar fazer filmes, a escrever, a lutar e a dar a cara por todas as mulheres que não conseguem ter voz, como tu me pediste um dia.
A Maria Zamora é, era, será sempre para quem a conheceu, pessoas maravilhosa, actriz talentosa, amiga extraordinária, transmontana de fibra, clown arco-íris, música de 7 instrumentos, melhor cantora do Maná-maná dos Marretas do mundo inteiro, florista, pessoa duma imaginação e duma generosidade infinitas, corajosa lutadora contra todas as adversidades que a vida lhe pôs desde criança, vida dura, e foram muitas. merece todo o nossos respeito, admiração e questionamento sobre como é que nós, a nossa sociedade trata as mulheres quando elas são vítimas de violência.
a tua morte não me parece real, minha mais que querida Maria. Quando chegar a Lisboa vou ligar-te, vens lá a casa beber um chá e como de costume vamos conversar e rir das amarguras como só tu és capaz de o fazer. as verdadeiras palhaças riem mesmo quando choram, não é, Maria?
prometo-te que quando voltar a Portugal vou saber processo contra a besta que te andou a fazer mal, ele será responsabilizado. não serás esquecida. para que nunca mais nenhuma mulher sofra o que tu sofreste. prometo que vou continuar fazer filmes, a escrever, a lutar e a dar a cara por todas as mulheres que não conseguem ter voz, como tu me pediste um dia.
vejo que nos escrevemos longamente mesmo antes de eu partir, tento ver sinais, não encontro. a tua ternura, a tua gentileza, brilham em cada palavra. revejo que me escreveste há 2 dias, a música, a grande paixão, nina simone.
prometo-te que não estarás sozinha nunca mais, Maria.
foste, és e serás amada por quem tem a alegria de te conhecer.
aqui não há passado. o tempo é uma coisa relativa, tu sabes bem, Maria. aqui há só amor e um bocadinho de saudade que teima em me embaciar os olhos.
tua,

raquel freire. —“

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