quarta-feira, 22 de maio de 2013

O PASSADO SENTADO ... memórias fiadas à lareira do passado...

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As mãos engelhadas, ainda sobre os velhos farrapos de linho, desfaziam a trama inventada em inúmeras noites de insónia, arredando o sono para a madrugada, esperavam o clarear da neblina acinzentada para sair da velha cozinha e deixar o carcomido escano, onde desenhada forma de pó de cinzas apagadas perpetuava o tempo do passado sentado, deixando marcas de nódoas de idade, faúlhas incandescentes saltando da fogueira brava, marcando a ferros ilegíveis iniciais de fogo, e horas sem descanso com mistura de lágrimas teimosas carregadas de frio, medo, tristeza e solidão, da mesma maneira de que é feita a escuridão que habita uma casa sem luz e as negras paredes de barro pintadas de fumo e humidade são palco de sombras dançantes pela chama da madeira consumindo-se em labaredas de línguas vermelhas e laranjas cores do braseiro aceso pela noite adentro, acarinhando o lume dando pátina à madeira encerada de saudade e ondulando as teias de aranha desabitadas debaixo das telhas soltas do telhado escurecido pelo fumeiro antigo, logo ao lado do forno a lenha sempre morno, de cúpula esbranquiçada e cheiro a pão quente, em colo de silêncios amassados com temperados dias e noites dobadas nas pontas dos dedos cansados da roca e do fuso, soltando-se memórias no crepitar do canto do fogo, em ladainhas aprendidas dos lábios de sabias bocas e olhos estremecidos na escura lentidão da vida.
A Ti Beatriz e a sua larga prole de dez filhos fazem do passado sentado a soleira aberta das recordações da porta escancarada para um futuro de palavras que se debruça no varandim do presente trazendo à luz do dia as memórias felizes de uma vida de pobreza e simplicidade que na eternidade da escrita enlaçam raízes de afetos e amizade.
Havia a fome com a fartura dos campos a soberba horta e os quintais cheios de verdura e fruta e os animais domésticos assegurando o sustento da casa onde nunca havia um tostão que sobrasse mas acreditava-se na malga cheia de caldo de feijão e as couves dando a força do sangue e o sabor de uma luta sem tréguas vencendo a miséria alheia repartida no lar apinhado de bocas para alimentar entregues ao deus dará no pino do escaldante verão ou no gélido invernoso tempo assegurando a geração de pés descalços e maltrapilhos e ranhosos narizes e lacrimosos olhos compilados de telas por pintar em inspirados instantes de cenas domésticas familiares em casarios de aldeias por descobrir, a pigmentos sépia e fraca claridade em tons de azulado sombreado sobre a memória abandonada desse passado esquecido na lembrança eterna do ser e sentir.
ana barbara santo antonio

2 comentários:

Anónimo disse...

Poderia dizer que estas são também memórias minhas.
A minha infância e adolescência foram rurais e assim continuo, filha da terra, de tanto que a amo.
Gostei muito do que li Ana Bárbara.
Beijos e parabéns.
Maria Mamede

Ana Bárbara Santo António disse...

Maria Mamede é uma honra ter aqui estas palavras por toda admiração que tenho pelo sentir da Poetisa Maria Mamede... palavras com sentidos tão profundos que se bebem num trago de inspiração quase paixão...

Muito Grata imensamente

ana barbara