sexta-feira, 31 de maio de 2013

CANOCHINHA E A FOFA NUVEM CHORONA - Conto Infantil

... e porque amanhã é DIA DA CRIANÇA... aqui fica uma historinha para contar logo a noite antes de adormecerem...

de ana bárbara de santo antónio

CANOCHINHA E A FOFA NUVEM CHORONA

Conto Infantil
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Era um país virado do avesso.
Ora deixa-me cá ver se eu não me esqueço do que vos vou dizer. Vou falar-vos de um menino travesso, com cara de anjinho mas que era um diabinho, um cão bolinha, traquina, de pelo pequenino todo enrolado, encaracolado, e uma nuvem endiabrada que nunca lhe escapava nada.
As pessoas viviam nas nuvens e as nuvens viviam na terra. E com esta confusão já nem sei quantos eles são?!
Ah! Já me lembro! Se calhar passou-se em Dezembro?!
Havia o CANOCHINHA, um miúdo de 5 anos, que vivia mais vezes nas nuvens do que tinha os pés na terra, sentia-se triste e sozinho porque não tinha manos, mas tinha um cão que tratava como um irmão, e não falava com estranhos. Mas se as nuvens estão na terra e as pessoas vivem nas nuvens como pode o CANOCHINHA não estar nas nuvens?
Também havia uma nuvem que se chamava FOFURA, muito malandrinha mas de uma enormeeeee doçura, fofa e pequenina de uma grandeeeee ternura, e que era uma nuvem chorona mas muito brincalhona. Ria por tudo e por nada e arreliava a rapaziada quando queriam ir brincar na rua e ela se transformava em lua sem olhar a meios, e escurecia o dia, roubando-lhes a alegria de correr em pleno dia de sol, então era um rol de nomes feios, daqueles que não se podem dizer, pois a mãe ou o pai ou seja lá quem for, podem nos ralhar ou bater, e depois se calhar dói de dor e de injustiça a valer, porque se os nomes existem é para que se possam dizer e não fiquem na preguiça de quem não os quis aprender.
Aprender era com o CANOCHINHA! E lá ia ele para a cozinha ver o seu pai a preparar os guisados, os cozidos, os assados, tudo lhe saía bem, melhor do que há sua mãe. Jeito ela não tinha para cozinhar, mas para mimarrrrrr… ai ai ai, que bem que ela sabia acarinhar, dava colinho e miminho, sempre que se fazia beicinho, ela nisso já não era como o pai, não era não! Mas amor de mãe ou amor de pai são do mesmo coração, letra da mesma canção.
Sempre que o miúdo saía com o cão, a nuvem FOFURA divertia-se com uma diabrura.
Andava o CANOCHINHA na rua em plena luz do dia, com o SABOGAS a passear, todo cheio de alegria, a cantarolarrrrr… e não querem ver o que passou a acontecer!
O dia ficou escuro, como se embatessem contra um muro, e começou a chover.
O miúdo e o cão ficaram atrapalhados, quase envergonhados pela sua figura, roupa molhada, pelo molhado, a manhã estragada o dia roubado, pois ficou de noiteeeee muito escurooooo, mas que loucura os dois a pingar, a nuvem chorona desatou a rir, e os dois nas nuvens com vontade de lhe dar um açoite, de tanta raiva a espumar só lhes apetecia gritarrrrr, completamente encharcados só lhes apetecia fugir, e a nuvem na terra a rir, a rirrrrrrrrrrrr.
Grande trapalhada! Era mesmo uma nuvem traquina, fosse de noite ou de dia, chovia em cada esquina. Toda a gente ficava arreliada com essa tropelia.
- Olha lá oh nuvem destrambelhadaaaaa, tu sabes o que estás a fazer? Pára lá de chover, ouviste! Estou-te a repreender! Volta a devolver o dia e leva lá a noite para outro lado, ou eu fico mesmo zangado!
- Não querem ver o miúdo reguila! A encher o peito como se fosse um gorila, eheheheheh, agora vai para casa secar o cabelo e bebe mas é um chá de camomila, ou a tua mãe chega-te a roupa ao pelo, porque vais ficar constipado, tu e o teu cão ensopado!
- E a culpa é tua, nuvem do tamanho da lua! Ai se te apanho torço-te até ficares deste tamanho, um grão de areia, sim, sim! Nunca mais ficas lua cheia!
- Pois mas isto é porque tu andaste a fazer disparates, é só uma lição, porque ontem deitaste muito limão na água da tua prima, e coitada da menina, ficou com a língua parecia uma tangerina, encarnada alaranjada a queimar!
O SABOGAS ajudou à festa e começou a ladrar e a rosnar e a saltitar com vontade de morder, para ver se apanhava a nuvem lua, à dentada, o CANOCHINHA limpava a água da testa a escorrer, era mesmo de enlouquecer!
Mas ela contorcia-se, torcia-se, retorcia-se, como um contorcionista de circo, mais parecia um trapezista no alto do arame, e chovia chuva a chover num derrame que só visto.
Chover chover chover era o que mais lhe dava prazer.
O SABOGAS parecia um pintainho saído do ovo ainda no ninho, uma desolação, cortava o coração. Mas o seu pelo molhado, o desengonçado cheirava mesmo a cão. O CANOCHINHA encharcado da cabeça aos pés, dava passos de lés-a-lés para chegar rapidamente a casa, trocar de roupa e secar o cabelo para não apanhar um resfriado, o pobre coitado não conseguira impedir a nuvem FOFURA de chorar a rir e parar com aquela loucura de fazer o dia ficar noite e ainda por cima, chover em cima da sua ternura o SABOGAS.
Mas o CANOCHINHA malandro, agarrou o globo da terra e virou-o ao contrário, fazendo a noite ficar dia, o sol brilhou por detrás da serra, e do outro lado da terra ficou noite. Com isso atrapalhou as nuvens todas, que já não sabiam se haviam de chover ou deixar-se levar com o vento, e nesta trapalhada, a terra por debaixo das nuvens, as nuvens por cima da terra, as pessoas começaram a cair das nuvens para o chão, a todo momento pum, lá caía mais um! E que grande trambolhão!
Agora era o miúdo traquina mais a fofura canina que desatavam a rirrrrr…
Mas não se deve rir do mal dos outros. Nem por fazer diabruras, malandrices e loucuras, pois aos poucos ganha-se fama, de que se é muito traquinas e os meninos e as meninas devem ser bem comportados, e não mal-intencionados, pois quem ama ensina, ensinando a amar comportar-se bem, ganha-se mil beijos da mãe, que nunca se cansa de nos beijar!
anabarbarasantoantonio
fim

(esta história tem sempre que terminar com um grande xi-coração da mãe ou do pai e trambolhões de beijinhos nas nuvens, e para terminar doces sonhos para os meninos e meninas irem descansar!)

quinta-feira, 30 de maio de 2013

AMOR DE CRIANÇA

em criança caminhamos lado a lado
num namoro do passado
que ficou bem para trás
e deixamos agora
o presente que se demora
num rosto distante fugaz
lembra a hora em que menina e tu rapaz
numa euforia audaz
seguíamos a estrada em caminhos paralelos
e nessa caminhada reforçávamos os elos
de um sentir a dois

mas a vida bem depois
esqueceu-se de nos dizer
que os momentos mais belos
nem sempre são feitos de prazer
e a vida pela estrada fora
no presente se demora
deixando-nos viver
mão na mão
a tua sobre a minha
e a nossa alma caminha
na estrada da ilusão
na construção do ser
eternamente até morrer

de mãos dadas
nas nossas caminhadas
no nosso querer
lado a lado
seguimos sonho do destino
seguimos nosso passado
seguimos mesmo caminho
com vontade de viver
este amor não vivido em criança
mas sonhado na esperança
de um dia o ver crescer

musa

quarta-feira, 29 de maio de 2013

NA LAMA DA FELICIDADE

NA LAMA DA FELICIDADE
Já não há mais segredos entre nós. Descobrimos a verdade na foz dos nossos sentidos onde o mar se junta com o rio e o sal das lágrimas se faz doce na humidade dos olhos cheios de sorrisos num abraço de sentir que se quer mais e mais e os dois juntos deitados na relva selvagem do estuário repleto de aves saltitando entre marés de vagas dançantes com asas de vento em rasantes instantes de um mistério emocional por descobrir.
Por um momento deixamos as mãos tocarem-se envergonhadas do tempo que as apartou, apertando-se e fechando-se num sentir do tamanho do mar e com a força do rio e a sensação de sossegar dentro de nós o cais de lodo que espera uma vaga para encher e fazer dançar a barca no leito seco do porto.
Só queria fazer-te sentir que o tempo parou onde o mar se junta em sal e doçura e na dança das águas da foz ainda há gaivotas que vão partir e outras que vão chegar como os nossos sonhos que não vivemos. Corre um rio de águas profundas e um mar de enchentes e baixios onde as aves nidificam escondendo os sonhos por cumprir. Mesmo não sabendo dos secretos instantes em que me sonhas acredito nos pássaros migratórios que levam e trazem momentos que foram nossos e serão sempre a praia da memória que fica para recordar em vagas de sentidos.
Fico com os teus dedos enrolados nos meus cabelos como as aves por entre os juncos em segredos e sentimentos, guardo o cheiro das tuas mãos em adocicada ventania com aromas de fenos e paisagens sobrevoadas noutros continentes, lembro perfumes das areias do deserto mais a sul na penugem molhada de asas com rumos longínquos na serenidade de horizontes e alvoradas enamorados dos astros celestiais na eternidade do tempo consagrado ao recordar da vida.
Há na ponta dos teus dedos um gosto seminal deixando odor a saudade exultando desejo e aventura na foz dos meus sentidos no rio da minha carne no mar dos meus olhos no estuário das tuas mãos fazendo-me mulher na ponta dos teus beijos pelo vento dos lábios em desorientada espera. Tenho-te como um segredo íntimo e visceral em sintonia com as aves as asas e as vagas que ainda adormecem nos meus sonhos e rodopiam nas palavras em embate na foz do sentir, e basta-me uns segundos da tua mãos e o cheiro dos teus dedos com perfume do tempo em que nos confrontamos num vale de lençóis e gestos em suor saliva e sémen partilhados no leito seco de barcas por naufragar. Eramos tu eu e todas as memórias sobreviventes dentro de nós e o sonho por resgatar das vagas soltas dos sentidos em maré cheia de deslumbramento. Quando estás comigo é assim.
E ninguém sabe que segredos contamos pelos caminhos à beira-mar nem quantos dos teus dedos se emaranham nos meus cabelos em secreto sentir e partilha de palavras e pensamentos e o gosto das conversas na brisa fresca cheirando a mar e molúsculos salgados e penas e murmúrios dos patos do pantanal no estuário da foz que descobrimos com os olhos vazios de separação.
Contas-me os teus sentidos e eu ouço o respirar emocionado das lagrimas por chorar no canto dos teus olhos no colo dos meus e ficamos assim os dois perdidos em conversas trazidas pelas aves migratórias ao estuário da foz entre areias e dunas incumpridas.
És um segredo que eu conto muitas vezes em riscos no céu feitos por aviões que chegam e partem por cima do mar e mergulham em cidades cansadas de viver perto de margens por descobrir e quando me dizes que o Porto é mais bonito visto do outro lado do rio já eu adivinho os teus sonhos por cima dos meus com vontade de dividir o leito seco do Douro e humedecer corpos e olhares em incansável instante devorado pelas chamas do amor nas águas frias do mar em que a foz se faz berço de vagas e areais de devaneios.
Não sei quem inventou a felicidade sobre a lama do contentamento ou quem sabe o real sabor e sentir dos sentidos em deslumbrada vontade de humedecer a lama visceral dos desejos perdidos ou proibido querer no lamaçal fecundo das vísceras arrancadas ao desgosto e angústia de não viver feliz. Os nossos minutos de felicidade são como aquela barca esperando a maré encher, na foz do rio na orla do mar, nem cais de sentidos tão profundos como o sentir que fazemos em nós vivendo.

musa

Amália / **Naufrágio** /


NAUFRÁGIO

Pus o meu sonho num navio
e o navio em cima do mar;
- depois, abri o mar com as mãos,
para o meu sonho naufragar

Minhas mãos ainda estão molhadas
do azul das ondas entreabertas,
e a cor que escorre de meus dedos
colore as areias desertas.

O vento vem vindo de longe,
a noite se curva de frio;
debaixo da água vai morrendo
meu sonho, dentro de um navio...

Chorarei quanto for preciso,
para fazer com que o mar cresça,
e o meu navio chegue ao fundo
e o meu sonho desapareça.

Depois, tudo estará perfeito;
praia lisa, águas ordenadas,
meus olhos secos como pedras
e as minhas duas mãos quebradas.

  

Cecília Meireles (Poetisa brasileira, 1901-1964)

A Prece-Amalia Rodrigues

PRECE

Talvez que eu morra no rio
Onde o sentir do pensar se tece
Nas margens da nostalgia
Crescem juncos de poesia
E toda a saudade desfalece
Há nos sentidos morte e prece
Há nos sentidos solidão e vazio
Há nos sentidos morte que apetece

Talvez que eu morra no mar
Onde a imensidão entontece
Em leito salgado e sombrio
E dê por mim a pensar
Que alma possa ser e naufragar
Com sentimentos velejar
Por águas profundas serenas
Nas doces margens amenas
Aí poder descansar

Talvez que eu morra na terra
Em chão fértil de saudade
Loucura d’alma perdida erra
Toda cumprida a vontade

Talvez que eu morra de mim
E afundada sem fim
Em terra no mar ou no rio
Talvez que eu morra assim
Em chão profundo e frio
Cravado no peito o punhal
Gélido pérfido o fio
No leito negro o missal
Nas mãos as flores do jardim
Talvez que eu morra de mim
Talvez que eu morra em Portugal
musa 

segunda-feira, 27 de maio de 2013

CARDOS NUS


há cardos crus
no âmago das palavras
gumes de sentidos acesos
corpos nus
desertos de águas
por escorrer
do sentir

fogos lavrando a seiva acesa
em chamas a refulgir
áridos montes de espinhos
a labareda presa
em incertos caminhos
os cardos nus
da fogueira dos sentidos
arestas limadas
bardos destinos
flores cortadas
botões por desabrochar
onde nascem ervas abandonadas
o chão de terra nunca há-de descansar

cardos crus por degustar
no palato a seiva agre
rompe as papilas de doçura
chama que se consome e arde
na nudez crua da loucura
musa

sábado, 25 de maio de 2013

CÚMPLICES DE MEMÓRIAS


CUMPLICES DE MEMÓRIAS
Há dias em que vem à memória o rastilho das lembranças ao saber de cor o teu contacto de telemóvel que fica a bailar no degrau dos lábios acesos pela chama rubra rosada do tom Chanel Rouge Coco nº 09 Organdi Rose baton, sabor a framboesas colhidas em manhã de orvalho pintada de uma aurora boreal com nuances de madrugada a despontar no sorriso da boca fechada a um silêncio por inventar.
Recordo a indecisão do teu sentir se seriam lábios de romã, morangos, cerejas ou outro fruto vermelho em tentação de pecado oferecido provocação por degustar, na sensualidade luz a raiar os nossos olhos ofuscando as palavras que os dois emudecíamos deixando silenciados sentidos tomar conta dos pensamentos que inventávamos em toque de pés por debaixo da mesa do café onde nos sentávamos esperando que os nossos sentimentos falassem do tempo e discutissem sobre como se formavam as ondas do mar e de quantas vagas se fazia uma praia ou quantas aterravam no areal à nossa frente.
Voltei vezes sem conta ao mesmo lugar e sempre sorria quando olhava à minha volta e procurava pernas e pés em cumplicidade por debaixo da mesa, atendendo ao mesmo pedido que me havias feito da mesma forma que se pede um beijo, envergonhando olhar e bocas, lá estavam quatro pernas e quatro pés num toque e foge de timidez e atrevimento, roçando a insustentável leveza de provocado consentimento e sensual sentir do encantamento, afagando palavras mudas dentro do peito e palavras surdas dentro da alma, dizias-me na urgência do amanhã que o sol ainda estava por nascer esperando a ponta do meu pé deslizando na tua perna raiando tremuras e vibrações lentas como sonoridades de flauta hipnotizando a cobra desde o tornozelo até ao joelho, num arrepio de fazer corar todos os frutos vermelhos da natureza, e em silente sussurro deixar o gesto transformar-se num ocaso em plena madrugada acabada de despontar ainda em tons rosados sobre o azul céu desmaiado de tímida inquietação. Eramos tu e eu e o resto das pernas e pés que nos rodeavam não sei se descalços se calçados, se com meias ou pés nus, o chão desaparecia aos nossos pés e nos sentíamos uns adolescentes com idade para saber que os frutos maduros se não forem colhidos acabam por cair ao chão ou apodrecem nos ramos da árvore da vida.
Talvez um dia descubramos a sensação de ser outra vez adolescentes com vontade de crescer e poder fazer coisas de adultos.
Há uma mesa de café que espera pela dança das nossas pernas e pés para perpetuar a mágica recordação de um instante de loucura a dois.
musa

quarta-feira, 22 de maio de 2013

O PASSADO SENTADO

O PASSADO SENTADO

AO AUTOR PORTUGUÊS em 2013


AO AUTOR PORTUGUÊS

Obreiro de palavras para toda a eternidade
O Autor Português senhor de todo sentir
É talvez o autor da palavra mais bela
Que nunca mas nunca se cansa de repetir
E lhe está na carne e na alma em saudade
Fazendo de Portugal a mais nobre cidadela
Onde a escrita sonha palavras de liberdade

A língua portuguesa da sua autoria
Veste fantasiados sonhos em prosa e verso
Musa inspiradora de tanta poesia
Portugal é a estrela do universo

Autor Português de um país de poetas
De ilustres prosadores que literatura reconheceu
Tem por todo mundo portas abertas
Nas mais cultas e sábias intenções despertas
Desde o Olimpo até ao Orpheu
Reconhecidas ou secretas
Da terra ao céu
Vibram incertas
Almas em corpo de palavras e sentidos
São gente de sonhos tantas vezes incompreendidos
Escritores poetas e outros escrevinhadores
De homens do campo até aos doutores
Das invenções até às descobertas
Das alegrias até às dores
O Autor Português é das vedetas
Entre simples estatuetas
Talvez o sonho deixado nos bastidores
musa

O PASSADO SENTADO ... memórias fiadas à lareira do passado...

https://www.facebook.com/pages/Parque-Natural-de-Montesinho/138895902791647

http://www.montesinhovivo.pt/site/index.php

As mãos engelhadas, ainda sobre os velhos farrapos de linho, desfaziam a trama inventada em inúmeras noites de insónia, arredando o sono para a madrugada, esperavam o clarear da neblina acinzentada para sair da velha cozinha e deixar o carcomido escano, onde desenhada forma de pó de cinzas apagadas perpetuava o tempo do passado sentado, deixando marcas de nódoas de idade, faúlhas incandescentes saltando da fogueira brava, marcando a ferros ilegíveis iniciais de fogo, e horas sem descanso com mistura de lágrimas teimosas carregadas de frio, medo, tristeza e solidão, da mesma maneira de que é feita a escuridão que habita uma casa sem luz e as negras paredes de barro pintadas de fumo e humidade são palco de sombras dançantes pela chama da madeira consumindo-se em labaredas de línguas vermelhas e laranjas cores do braseiro aceso pela noite adentro, acarinhando o lume dando pátina à madeira encerada de saudade e ondulando as teias de aranha desabitadas debaixo das telhas soltas do telhado escurecido pelo fumeiro antigo, logo ao lado do forno a lenha sempre morno, de cúpula esbranquiçada e cheiro a pão quente, em colo de silêncios amassados com temperados dias e noites dobadas nas pontas dos dedos cansados da roca e do fuso, soltando-se memórias no crepitar do canto do fogo, em ladainhas aprendidas dos lábios de sabias bocas e olhos estremecidos na escura lentidão da vida.
A Ti Beatriz e a sua larga prole de dez filhos fazem do passado sentado a soleira aberta das recordações da porta escancarada para um futuro de palavras que se debruça no varandim do presente trazendo à luz do dia as memórias felizes de uma vida de pobreza e simplicidade que na eternidade da escrita enlaçam raízes de afetos e amizade.
Havia a fome com a fartura dos campos a soberba horta e os quintais cheios de verdura e fruta e os animais domésticos assegurando o sustento da casa onde nunca havia um tostão que sobrasse mas acreditava-se na malga cheia de caldo de feijão e as couves dando a força do sangue e o sabor de uma luta sem tréguas vencendo a miséria alheia repartida no lar apinhado de bocas para alimentar entregues ao deus dará no pino do escaldante verão ou no gélido invernoso tempo assegurando a geração de pés descalços e maltrapilhos e ranhosos narizes e lacrimosos olhos compilados de telas por pintar em inspirados instantes de cenas domésticas familiares em casarios de aldeias por descobrir, a pigmentos sépia e fraca claridade em tons de azulado sombreado sobre a memória abandonada desse passado esquecido na lembrança eterna do ser e sentir.
ana barbara santo antonio

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Dueto com JOÃO PAULO MARTINS - desconstrução em excesso




DESCONSTRUÇÃO EM EXCESSO

Paralisado à porta de entrada,
aproveitava a chegada do sossego.
A noite tem espaços dedicados
ao longo acontecer da imaginação.

É com o acordar que se busca a boca
encharcada de saliva onde está sabor da língua,
porque a casa arrendada ao odor do corpo
reside na expropriação do palácio habitado de gemidos.

A sala de visitas está decorada de cansaço
e os sentidos embalam-te por dentro.
É nesses lugares sem nome
que o prazer tem a marca da criatividade.
E os pequenos pedaços de pele
guardam os arrepios para te estremecerem.

Enquanto isso,
esquecemos porque vai passear a sedução
debaixo dos piropos que fazem sorrir.
JOÃO PAULO MARTINS (Juan Pablo)

***
há casas vazias cheias de palavras
em quartos por arrumar
casulos violados em janelas por abrir
teias de emaranhados sótãos por decifrar
corredores sem luz e sem ar
caves por descobrir
passeio a pairar

assoalhadas por arrendar
na tua pele abandonada
o pó toma conta dos poros suados
a madeira carcomida e descascada
faz das paredes telas por pintar
e os tectos dos teus olhos fechados
são a casa sem luz onde nunca vou habitar

arrendas-me em palavras sem sentir
sem identificados degraus
por onde possa subir
o montão de escombros calhaus
que ficou do teu abandono
nesta casa sem dono
onde vou existir
...
musa

TALVEZ SEJA EU


Olho o retrato
Na tela emudecida
Talvez seja eu
Na pintura esquecida
Na gravura perdida
Na inscultura fingida
Talvez seja eu

No olhar no gosto no tato
Um risco um traço teu
Da mão enternecida
Na tela o meu retrato
Em sépia e azul céu
E parte da minha vida
Desenhado camafeu

Talvez seja eu
As cores nela pintada
Uma existência contada
No pranto de suaves dores
Uma história retratada
Destino de vários amores
Um olhar só meu

Talvez seja eu
Inscrita no painel
No rosto a cor da pele
Em travo amargo mel
Em beijos de pincel
Em bocas de papel
Talvez seja eu

Retratada inspiração
No quadro colorido
Faz todo o sentido
Na tela a ilustração
Talvez seja eu
Talvez seja o meu olhar
Talvez seja o meu rosto
Quase igual ao meu
A luz a cintilar
A cor de que eu gosto
Talvez seja eu
Nesse rosto por pintar
musa

Dueto com IVAN LINS – “ainda te procuro”


fotos GAIA É CULTURA - no Cine Teatro Eduardo Brazão em Valadares

Ainda Te Procuro
Ivan Lins

Eu ainda te procuro
No claro, no escuro
Nos lugares seguros ou não

Eu ainda te procuro
Com olhos de águia
Com o faro agudo de cão

Eu ainda te procuro
De uma forma sobre-humana
Nas cartas da cigana
Ainda estás nas minhas mãos
E uma chance dessas não se perde assim
Já é hora de eu gostar mais de mim

Eu ainda te procuro
Porque és a minha cara
Um bem que não cortei pela raiz

Eu ainda te procuro
Pelo amor, pelo futuro
Me recuso a desistir de ser feliz

***
escrevo no ensurdecedor silencio da noite em pulsante sentir...

Eu ainda te procuro
Num recanto obscuro
No silêncio ensurdecedor da noite
No pranto quieto da solidão

Eu ainda te procuro
No chicote no açoite
A rédea solta na mão
Salto a cerca salto o muro
Salto para o chão

Eu ainda te procuro
Nas linhas da cartomante
No horizonte distante
Nas lembranças de amante
No sossego e na inquietação

Eu ainda te procuro
E sempre te hei-de procurar
Em pulsante sentir
Eu ainda vou-te achar
Chances não se perdem assim
Não adianta fingir
Gosto de ti e tu de mim
Procurar não é fugir
É lutar até ao fim

Eu ainda te procuro
Nunca hei-de desistir
Rumo certo ao futuro
Na certeza de conseguir
Na força dessa raiz
Eu ainda te procuro
Para um dia ser feliz
Num lugar certo seguro
musa

domingo, 19 de maio de 2013

CACOS DESPOJOS RESTOS

DIA INTERNACIONAL DOS MUSEUS - 18 MAIO 2013
http://www.imc-ip.pt/


Extintas culturas e modos de vida
Já só restam cacos despojos restos
De uma antiguidade desaparecida
Humanos sentidos funestos
Uma existência perdida
E o tempo aprisionado
Em doce arqueologia
Resta o sonho
Demagogia

Da pré-história às civilizações da antiguidade
Os objetos o culto as artes
Do passado à modernidade
Expostos testemunhos de uma eterna saudade
Toda inteira repartida unida ou em partes
No museu descansa qual divindade
Erguidos da terra despojos perdidos
Templo das musas colecionadas
Dos artefactos aos sentidos
Nas sombras iluminadas
Perde-se lhe a idade
A ilusão perdura
Ode loucura
Sensualidade

Nas galerias da ternura
Num abraço de intimidade
Guarda-se o tempo
Ao serviço da humanidade
Testemunho cultural
Recordado pensamento
Cidadania liberdade
História natural
Eterno sentimento
Sentimental
musa