sábado, 31 de dezembro de 2011

MÃE TERRA

Mãe terra
Os campos vazios
As árvores despidas
Os rios frios
As águas vertidas
O tempo adormecido
No teu regaço esquecido
Águas escorrem montanhas
Brumas vestem planícies
Apodrecem as folhas castanhas
Em humedecidas superfícies
Sincelos enfeitam ramos
Na nudez das campinas
Pastam sossegados gamos
Deixadas agrestes ravinas
E o ano finda
Acolhe a doce brancura
Dos dias em que ainda
Saboreia alguma loucura
E tu terrena adormecida
Mãe sagrada natureza
Assim completas a vida
De encanto estranha beleza
Deusa pagando tributos
Ao universo derramado
Flores verdes folhas frutos
Em cada tempo denominado
Sagração das estações
A um desejo atribulado
Da vida que te ama
És bela senhora terra dama
Em ti batem frágeis corações
De uma riqueza inconcebível
Na quimera das ilusões
Em todos os elementos
Alertando o insensível
De todos os sentimentos
Terra Mãe proclamada
Natureza pungente
Soberana amada
Que vida sente
musa

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

ÁGUAS DOURADAS

De nudez vestida
Entro nas águas iluminadas
Há faúlhas de ouro tombadas
Chamas de luz vertida
À flor das águas douradas
Mar de água florida
Águas sombreadas
Luz acendida
Ateadas
A vida

São essas águas resplandecentes
Intensidade fluida
Flamas transparentes
Como farrapos de ouro
A brilhar sobre as águas quietas
O corpo nu com seu tesouro
E tantas as sensações despertas
Nessa nudez dourada
Nessa pele molhada
Nessa chama ateada
Que o sol incendeia de luz
E o fogo ateia sobre o mar
Nesse ouro que seduz
Quem nas águas entrar
Banhando-se no ouro das vagas
Com reflexos doirados
Na timidez que guarda
Adormece e limpa
De ouro pecados
Em humidade que consinta
Banho de purificação
Sonhos sagrados
Doce iniciação
No mar sinta
Alma e couro
Essa sensação
De ouro
musa

NOTA PERDIDA

Sou clave de sol
Nota perdida
Onde não brilha mais
O sol da minha vida
Nota de uma pauta
Partitura
Esse amor que me falta
Entrelinhas da melodia
Razão da minha loucura
Clave poesia
Sol iluminado
Ternura
Passado
Notas de um céu estrelado
Brilho fantasia
Na pauta dos sentidos
Choro magoado
Sonhos perdidos
Sons desencontrados
Sentimentos
Acordes humedecidos
Pensamentos
Onde te poderei ouvir?
Percorro a inspiração
Deixo a respiração sentir
Nesta doce suspiração
Perco o rumo do compasso
Vou passo a passo
Por aí…
A ver se alguma vez te senti…
musa

VAIS VOLTAR


      Para ti...

Não sei que palavras
Partilhar por ti
Como aves soltas
Dos meus sentidos
De tudo o que senti
As tuas em mim envoltas
Da vida que me trazes
Em tesouros perdidos
Como um fundo de mar
Tudo o que em mim fazes
Risos murmúrios cantos
Choros preces prantos
E a tua voz para me acalmar
E o teu ser a me sossegar

... voltas à janela dos nossos dias
onde irás sempre te surpreender
cruzando olhar terra e mar
e as palavras húmidas e frias
do tempo que deixaste acontecer
do silêncio dos dias a repousar
entre a distância e o querer
entre nós ficar...

Sossega-me e diz-me que vai voltar
Onde todos os lugares que não conheço
todas as alegrias que mereço
nos teus lábios poder beijar
o beijo ausente que não esqueço
entre o ser e o soluçar
entre o ter e o alcançar
entre viver e o sonhar

e dizes tu que vais voltar
em dias de bruma
doce solidão
vagas de espuma
nesse mar de paixão
de ondas a balançar
salgada poesia
dócil olhar
praia sem fim
vais voltar
um dia
para mim
...
musa

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

A CORUJA

Solitária coruja pia tristemente
Guarda o seu ninho no negro telhado
Pia amargurada um choro de gente
Como um menino dum colo roubado

Levaram-lhe os filhos sem explicação
Que dor é ouvir seu triste gemer
Quando a noite desce fria solidão
Estranho é seu canto parece morrer

Vazios seus olhos brilham noite escura
Sobre o telhado que não quer deixar
Pia desgraçada sua desventura
Pede os seus filhos que vieram roubar

Pia abandonada inerte como um farol
Morre de fome e sede de boa vontade
Ao vento ao frio à chuva e ao sol
Pia tristemente de dor e de saudade

Já ninguém a vê sobre o alto telhado
Todos a procuram com o mesmo olhar
Mas juram ouvir seu pio cansado
Decerto morreu de tanto chorar
musa

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

PASSOS NUS NA CIDADE


Deixem-me escrever um poema
De pés descalços
Caminhar nua pela cidade
Percorrer de olhos fechados
As sombrias avenidas
Por entre as árvores a frialdade
Que esconde tantas almas sentidas
Em passos cegos apressados
Carregando solitárias vidas

Ninguém vai dar por mim
Sei que não me vão ver
Passarei despercebida
De olhar preso assim
Ao corpo do viver
Morta sentida
Quase no fim
Da vida

Deixem-me sentir o chão dos meus passos
Na palma do pé as dores da indiferença
Em cada dedo impressões compassos
Como sinais comprados à nascença
Os pés nus enfeitados de laços
A marcar pelos caminhos presença
Como se entre o chão e os abraços
Sem qualquer desavença
A pobre vida solitária
Na sua própria penitenciária
Descalça sentida
Fosse da morte pertença
Ainda que consentida
A essa existência
Perdida
musa

AVENIDA DOS ALIADOS


Grávida a avenida cheia de gente
É um ventre apinhado
Arredondado
De almas que o corpo sente
Ocupando espaço nos passeios
De fartos e volumosos seios
Na fartura dos encontrões
No passear de desilusões
Olhando montras fantasiadas
Tal como as ruas iluminadas
Deixando transparecer
O cordão umbilical
Que acolhe de prazer
Esta época de Natal
E engorda a avenida
De gentes em passeata
Iludindo a doce vida
Com o correr da regata
Lembrando a Natividade
Que leva gente à cidade
E parece querer dizer
Apressem-se gente
Que eu estou para nascer
Dando à avenida o presente
Prenhe de harmonia e sentimento
De qualquer coisa que vai acontecer
Nesta cidade em movimento
musa

ALMA PORTO SOLIDÃO


Talvez eu nunca a tenha sentido
Mas por dentro nunca perdido
Ainda que por vezes perto
Um querer estranho secreto
De todo esse sentir fontanário
Descendo ruas até à Ribeira
E cada porta conta do rosário
Dessa prece da vida inteira
Num consentir solitário
Da vida dessa maneira
Murmurada oração
Em solidão

Alma irmã paixão companheira
Que em cada esquina cada abrigo
Cada sentença crime ou castigo
Parece em mim sentenciar
E por dentro libertar
Alma do carcere fechada
Nos bairros da cidade guardada
Em mistérios e segredos
Lavada nas pedras dos medos
Nas águas do rio Douro
Escondido triste tesouro
Como aberto sangrado peito
E leva no rio do leito
Tangente inspiração
Onde tantas vezes me deito
Em noites de solidão
musa

sábado, 17 de dezembro de 2011

MAR AZUL (dedicado a CESÁRIA ÉVORA – a voz de Cabo Verde partilhada com França e Portugal) RIP



Deusa dos pés nus Diva bela
Por esse caminho longo sentido
Marinheira de tão doce caravela
De São Vicente porto perdido
Tua vida feita imenso mar azul
Na tua voz bailam as vagas
Fazem ondular a sodade lá a sul
Da ilha de Cabo Verde tu guardas
Formosa terra nostalgia canto
Crioula dama da morna e coladeira
Canções da terra do mar fiandeira
Choro de mel derramado pranto
Para sempre chegaste a esse azul mar
Amortalhada em tua voz linda prece
De todos quantos em terra vão chorar
A musa dos pés descalços que de sodade tece
Idílicas paisagens para lembrar
Teia do tempo vagas lamento mar mansinho
Nosso olhar de admiração emudece
Que agora saudade deixa destino
musa

TEMPO E POESIA (a EDUARDO LOURENÇO - Prémio Pessoa 2011 )



Tempo e Poesia – À Volta da Literatura, Porto, Ed. Inova, 1974 (2.ª edição na Relógio de 
Água, Lisboa, 1987; republicado em 2003). 

Palavras
Que alimentam o meu sentir
À volta da literatura
E todo este consentir
Do pensar à poesia
Toda esta loucura
Toda esta euforia
Que me leva do tempo
Em pensamento
Em ousadia
De sentir

Erguida no ruir
Das palavras feitas temporal
Deixo por dentro fluir
Mestre Lourenço me ensina a dias
Trago dos Poetas maiores de Portugal
Sentimentos feitos poesias
E tão pouco é ainda o meu saber
E o dele tão magistral
De ritos signos intemporal
De tão intenso prazer
Em fluxos de labirintos de saudade
Onde todo ele a transparecer
Na suprema existência do poema
Osmose de toda a oralidade
Feita pedra rara gema
Doce mocidade
Com rosto de Esfinge
Palavra silenciada
Tempo fantasia
Onde não finge
Essa poesia
Inominada
musa

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

ÁRVORES DESPIDAS


Autor(a) Fernando Martins
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O dia cinzento
Recolhe-se em mim adentro
Fustiga-me o vento
Húmida frialdade
Invade o pensamento
Tolda a claridade
O sentimento
Vem das árvores despidas
O chão orvalhado
As folhas caídas
O dia pesado
E todas as despedidas
Em abraços de Inverno
Troncos e ramos nus
No círculo eterno
Alimentam olhos crus
Nessa dolente afasia
Em que a brisa quieta
Silencia os dias
E em mim desperta
Instantes de poesias
musa

NEBLINA DO OLHAR


Densa neblina repousa no olhar
Condensa as lágrimas de tanto chorar
Cada dia a cortina mais pesada
E a alma aturdida cansada
Só pede para descansar

Véus que bailam na iris multicolor
Por detrás das pupilas molhadas
Segue a dança do arco-íris da dor
Em humedecida negação
As meninas dos olhos cansadas
Levitam no nevoeiro da solidão
Em escuras sensações veladas

Rios de lágrimas escorrem
Pelo vale húmido dos afetos
Mar de neblina toma conta do ser
Alguns dos sonhos morrem
Ficam desejos secretos
A vida a transparecer

Em fios de ousadia discretos
E toda esta vontade de viver
E toda esta loucura de querer
E toda esta insistência de vencer
musa

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

ESSÊNCIA SEDENTA


Pudera ter a essência
De tudo o que iluminas
Táctil transparência
Que perscrutas fulminas
Olhos sedentos de pele de prata
Exalando sorrisos com vontade
Que fere e mata de ansiedade

Na transparência do teu sossego
As palavras com gumes luzidios
A afiar as gargantas do tempo
Escondendo o medo
E todos os vazios
Sentimento

Ter todas as palavras iluminadas
Na água do deserto em que flutuas
Ramificadas as tuas mãos sagradas
À luz imaculadas de mil luas

Pálidas noites em sol do teu olhar
Grávidas flores a desabrochar
De essências feitas poemas
Pálpebras cansadas
Pétalas de açucenas
Brancas imaculadas
Em fome opulenta
Essência sedenta
De todo teu sentir
Dado em verso
Feito universo
A florir
musa

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

IMACULADA CONCEIÇÃO RAINHA DE PORTUGAL


Celebra-se hoje a festa da Imaculada Conceição de Maria, padroeira e rainha de Portugal. Foi D. João IV quem decidiu consagrar o país a Nossa Senhora, após a restauração da independência, desde então nunca mais os reis portugueses voltaram a colocar a coroa na cabeça.

Uma devoção com raízes que se perdem no tempo, como recorda o reitor do Santuário de Vila Viçosa, padre Mário Tavares de Oliveira. “Vila Viçosa é o primeiro tempo dedicado à Imaculada Conceição na Península Ibérica, que denota no século XIV um crescendo desta devoção, culminando com o ato de D. João IV, que no dia 25 de Março de 1646, proclama Nossa Senhora da Conceição padroeira de Portugal.”

NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO
Caminho entre o céu e a terra
O Espírito Santo derrama sobre Ti
Sua luz virginal
E na alma senti
Entre as flores mais belas
Teu manto azul celestial
Virgem coroada de doze estrelas
As doze tribos de Israel
O mesmo número de apóstolos
Que desatam o cordel
Das dúvidas desanuviadora
Das angústias consoladora
Das perseguições fortaleza
Revestida de um sol dourado
Rainha de grande beleza
Teu nome tantas vezes invocado
A lua a Teus pés Senhora
Como uma aurora nascente
E eu humilde adoradora
O Teu olhar comovente
Com eles esmagas o mal da serpente
E os anjos te glorificam e amparam
Contigo os nós se separam
Para que finde a escuridão
Se acabe a solidão
Ao vê-la tão bela e cheia de glória
Senhora da Conceição
Padroeira de graça e de vida
Portugal te consagraram
E assim ficou para a história
Como o reino da prometida
Que ao longo dos anos contaram
Senhora jamais esquecida
Nossa Senhora da Conceição
A quem eu venero admiração
E rogo em prece minha oração
Em perdão comoção sentida
...
musa

PARABÉNS MÃE


domingo, 4 de dezembro de 2011

BALSA DA VIDA


Ainda nos meus sentidos rodopio
Nessa balsa da vida à deriva
Com os pescadores mortos de frio
E o medo no corpo feito ferida

Pescadores protegidos
Do mar furioso resgatados
Por mais de três dias perdidos
Em terra já eram chorados

No colo bravo das ondas
Embalo da balsa perdida
Mar que tantas vidas mondas
Sem adeus nem despedida

Seria Neptuno adormecido
Deus que estendia proteção
Na alma um milagre era pedido
A rogo de preces e oração

Por destino ou milagre se salvaram
Homens marinheiros pescadores
Penosa “balsa” todos dançaram
Sentindo na pele medo e dores
musa